quarta-feira, janeiro 26, 2005

Há dias assim.

Passei o dia todo à procura dele.
Corri léguas de asfalto...
Desbravei florestas em perigo... (delas ou meu?)

Atravessei estradas sem passadeiras...
Guiei sem o cinto de segurança...
Estacionei em locais proibidos...
Ultrapassei barreiras de silêncio...
Tive uma multa por excesso de optimismo...
Vi sorrisos quase felizes...
Ouvi quase um lamento e mandei-o calar.
Fiz malabarismos para conseguir uma imagem aceitável...

Escrevi uma frase quase, quase...
Imitei os profissionais...

O lamento já era um riso...
Fui palhaço de circo...
Empurrei os choros para dentro das caixas negras dos aviões que estão ainda em terra...

Rasguei a multa, porque estava molhada de lágrimas de chuva...

Olhei para o relógio. Apenas uma vez. O Tempo tinha de ser meu hoje...

Amnistiei as ansiedades...
Bebi trinta cafés e fumei outros tantos cigarros às escondidas dos radicais...
Apanhei chuva, molhei a alma e o corpo...
Sei que vou escrever o todo da frase... Falta apenas um ponto ou uma vírgula. Coisa pouca...
Não desisti...
Fiz uma pessoa feliz...
Respirei fundo... tinha o dia ganho?

Editado em Mulheres em Chamas


Há dias assim, como este que escrevi há séculos atrás.

Nesse dia, eu procurava o Arco-íris.

Hoje não procurei nada. Hoje cumpri missões. Senti-me no limiar de mim. À beira das forças. Apeteceu-me desistir. Render-me. Hastear a bandeira branca e fechar os olhos.
Cansada. Exausta. Chega de poemas. Hoje não sou fada, nem bruxa, nem borboleta, nem palhaço, nem flor. Nem prazer de mim. Chega de palavras.

Mas a vida é um carrossel. Há quem diga que a vida é uma puta. Eu gosto mais de a imaginar como uma montanha russa. Se bem, que respeite as putas. Um dia hei-de escrever um poema sobre uma puta que “vivia” na esquina onde eu passava todos os dias da minha juventude a caminho do liceu. Não. Não vou escrever um poema sobre ela. Um dia, hei-de conhecer-lhe o coração. Eu e ela, nunca nos falámos, mas trocávamos olhares. Ela sabia que eu adivinhava, eu sabia que ela se escondia do meu olhar. Ela era tão feia, eu era tão ignorante. Por isso, sei que nos iremos encontrar um dia. Porque eu já sei mais umas coisas (poucas) e ela já se tornou bonita no meu olhar.

E a minha montanha russa, dirão vocês?
Pois é. Não houve arco-íris no meu dia de hoje. Houve um frio que me percorre há anos, houve a tristeza infinita que me acompanha nas caminhadas, houve a noite que chega antes da hora prevista.

Mas, mas, mas…
Mas houve abraços quentes no meu pescoço de saudades recuperadas no fim do dia, houve uma ternura por um amigo lá longe de saudades por matar que me deu, houve uma gargalhada que soltei.
Na volta, ganhei um arco-íris. Ganhei um dia.